18 de fev. de 2021

Berlin Alexanderplatz: A Morte e vida de Francis

Berlin Alexanderplatz

Quando Francis aparece na tela, ele afunda nas águas e sussurros emanam como prece para narrar seu renascimento. Eis o seu batismo, como aquele no rio em que o velho homem submerge para que o novo inicie uma trajetória cheia  de possibilidades, renegando um passado para que o futuro seja feito de sua nova história. 


Renascendo em Berlin, o único desejo de Francis é ser bom. Mas como consegui-lo em um mundo que insiste em ser mau? O seu primeiro obstáculo está posto e é magistralmente orquestrado por Reinhold que personifica todas as tentações e pecados que o sonho alemão representando o céu impõe para os anjos caídos em seu seio. 


Dividido em cinco partes, Berlin Alexanderplatz é um ensaio de humanidade e do mundo. O diretor e roteirista Burhan Qurbani nos conduz a um indigesto espelho de nós mesmos e da sociedade que criamos baseada na força, no poder, na subjugação das nossas relações e dos lugares em que insistimos manter para sobrevivermos.


Em três horas de filme, morremos e renascemos com Francis. Desejamos que ele acorde para a desumanização que cremos que ele não saiba que sobrevive. E nos questionamos sobre quem é o Vilão, quem é o mocinho, quem é o certo ou o errado. Seria possível encontrar bondade e Amor num contexto de crime? E talvez chegamos à conclusão de que a vida não é dicotômica e entre os extremos existe um  mar de nuances que nos colocam em diversos papéis. E é nestas águas que Francis navega.


Berlin Alexanderplatz



Baseado na obra de Alfred Döblin, o filme dialoga conosco sobre ser refugiado num contexto geográfico e de Alma descortinando também  o véu daquilo que consideramos Paraíso. Uma Alemanha subterrânea emerge de sua crueldade expondo suas contradições sociais, a desumanização daqueles que buscam novas oportunidades e o oportunismo dos que usam desta vulnerabilidade sistemática para sugarem estas vidas jogando com suas sobrevivências. 


Eu poderia dizer que em muitos momentos Francis é a personificação de nossa luta universal humana, mas não seria de todo verdade. O fato de Francis ser refugiado e negro o coloca em situações em que muitos de nós não somos diretamente atraveassados. E ser quem é faz com que sua jornada seja invariavelmente mais difícil do que as nossas seriam. E neste ponto o filme é implacável e didático em nos mostrar como o racismo estrutural e as relações capitalistas se mantém e baseiam o mundo.


Um sucesso na 44a Mostra Internacional de Cinema, o filme Berlin Alexanderplatz, ainda que num contexto de particularidades históricas alemãs, é um espelho do mundo, e estreia hoje nos cinemas brasileiros.








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